A Edições K é uma editora independente fundada no ano passado por escritores de diversos pontos do País. Em expansão rápida, a
cooperativa de editores já lançou 13 livros, de nove autores e – graças ao
empenho do grupo – vem firmando-se como um espaço importante para novas vozes da literatura brasileira. O pernambucano Wladimir Cazé é
um dos fundadores do grupo e, depois do cordel “A Filha do Imperador que
foi Morta em Petrolina”, lança seu segundo livro, “Microafetos”.
Coletânea de 44 poemas escritos entre 1997 e 2005, “Microafetos” é
divido em quatro partes com unidade formal e temática: “Caterva”, “Fauna
Miúda”, “Microafetos” e “Ocasiões”. Apoiados em imagens fortes, os poemas de Cazé antropomorfizam insetos e répteis. Ao contrário do que
se poderia esperar, não há exaltação à natureza: é ela que se torna imperfeita e neurótica.
Cazé é um poeta cerebral, que nunca se deixa tomar por qualquer
arroubo de emoção. São jogos formais rigorosos que dão origem aos textos, cheios de aliterações e eufonias. Graças a esses jogos, os poemas adquirem um ritmo poderoso, sem recorrer às formas canônicas. O melhor exemplo disso está na terceira parte do livro, que usa proparoxítonas com resultados sonoros: “Na areia úmida de um mangue incômodo, / o radar do caranguejo alienígena / localiza a lagosta afrodisíaca: / namoro catártico num mundo autônomo.” Para se ler em voz alta.
Apesar dos jogos, a poesia tem seus momentos de lirismo, mesmo que estranho. As coisinhas nojentas se tornam quase ternas no verso de Cazé, efeito que ganha corpo com as ilustrações de Iansã Negrão. Contemporâneo e urbano sem se render a elementos ou citações datadas, “Microafetos” é poesia de primeira, sem nenhum mofo nostálgico.
Rodolfo S. Filho, A Tarde, caderno Dez!, 15/09/2005