Silva horrida - Guia de cidades

DESCRIÇÃO PRÁTICA E POÉTICA DO TERRITÓRIO OCUPADO

Tuesday, May 27, 2008

"O 'entre-lugar' do imaginário agrário e urbano da cidade é até hoje referência ambígua em várias narrativas literárias e cinematográficas. O espaço cosmopolita é narrado como plural: diverso e/ou adverso, principalmente ao enfocar personagens 'estrangeiros', como os migrantes nordestinos. Nos enredos aparece a imagem da cidade empreendedora e trágica do 'capitalismo selvagem' (...); ao mesmo tempo, é uma imagem que desafia e desafina o discurso trágico com personagens líricos de extremo humanismo, sendo um contra-ponto irracional/racional no sistema capitalista, agenciando nos centros e periferias as forças telúricas e tradicionais da cultura rural dos migrantes (...)" (ps. 19-20)

(Cláudio C. Novaes, "Uma introdução longa-metragem", in: "Cinema sertanejo - O sertão no olho do dragão", Edições UEFS/MAC, 2007)
"Diferentemente das outras secas, a de 1951-1953 acabou impulsionando o fluxo migratório do Nordeste em direção ao Sul, principalmente para São Paulo, Rio de Janeiro e o oeste do Paraná (...). A melhoria dos meios de transporte, especialmente do transporte rodoviário, facilitou a viagem em busca de uma vida melhor, longe do latifúndio, da prepotência dos coronéis e do flagelo da seca. (...) Utilizando-se de vapores, que percorriam o rio São Francisco até Pirapora, de trens e de caminhões, centenas de milhares de nordestinos deslocaram-se para o Sul, sem nenhum apoio oficial, na maior migração da História do Brasil. (...) A avalanche foi espontânea e surpreendeu os governos. A estrada Rio-Bahia transformou-se no maior conduto dessa migração. A cada dia, dezenas e dezenas de caminhões, transportando de setenta a noventa pessoas em média, seguiam para o Rio de Janeiro e para São Paulo - cobravam-se, em média, 500 cruzeiros pela passagem (...). As péssimas condições da estrada, a superlotação dos caminhões, a falta de infra-estrutura à beira da Rio-Bahia acabaram dando tinturas épicas a esse movimento migratório. (...) a viagem durava entre oito e catorze dias (...)" (p. 170-171)

"(...) cada sertanejo assumia para si o enfrentamento da miséria secular: em vez de se travar na região um confronto com os poderosos, a migração transplantou para o Sul (...) a luta de classes. O sertanejo, agora como operário e participante da sociedade de massas, passava a ser um agente da História - com todas as limitações oriundas do populismo - no pólo mais dinâmico da economia capitalista brasileira" (p. 176)

(Marco Antonio Villa, "Vida e morte no sertão - História das secas no Nordeste nos séculos XIX e XX")




"Vida e morte no sertão - História das secas no Nordeste nos séculos XIX e XX", de Marco Antonio Villa (Ed. Ática, 2000, 274 páginas) reconstitui décadas e décadas de agruras do povo, descaso dos governos, saques, doenças e migrações coletivas, numa reincidência que induz o historiador a constatar, ao término de sua narrativa (no ponto em que começa a gestão Figueredo): "Os fatores de conservação transformaram o semi-árido em uma região aparentemente sem História, dada a permanência e imutabilidade dos problemas. Como se com o decorrer das décadas nada tivesse se alterado e o presente fosse um eterno passado" (p. 252).

Friday, May 23, 2008

Eu, Sandro Ornellas e Katherine Funke faremos um "Recital de Poesia Baiana" no encerramento do evento Mayo de Las Letras, na cidade de San Miguel de Tucumán, noroeste da Argentina, na sexta-feira, 30 de maio de 2008, às 20h30, na Sala Caviglia (Rua San Martín, 251). Lerei trechos de meu folheto de cordel "A filha do Imperador que foi morta em Petrolina" (de 2004) e de poemas de Gregório de Mattos e fragmentos de contos dos bróders Gustavo Rios, Patrick Brock e Paulo Bullar. Sandro lerá poemas da própria lavra e versos de Waly Salomão e Lupeu Lacerda. Na trilha sonora do recital, Katherine vai tocar violão elétrico e também cantar um pouco. Na véspera, no mesmo local, às 20h, Sandro Ornellas, que além de poeta é professor de letras da UFBA, apresentará a palestra “Literatura baiana: Entre 'regionalismo' e 'cosmopolitismo' ”, tratando do cenário atual das letras em nosso estado. Quem nos leva é a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, com apoio do Ente Cultural de Tucumán. Hasta la vista!

Wednesday, May 07, 2008

MÃE NATUREZA VIVA

A Mãe Natureza Viva
passa, pássara de água,
por entre ondas de fogo,
carregando seu caçula
(no casulo sob as asas)
para o ninho e o repouso.

Valente, a ave defende
das ameaças do mundo
o pequenino rebento.
Frutas extrai dos cabelos
para servir de sustento.
À noite, vela-lhe o sono.

Quando o planeta amanhece,
ao infante ela oferece
interestelar alimento.


Wladimir Cazé © 2008


Acrílico sobre tela: Ery Cruz